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Ser normal é coisa que não existe. Todos temos as nossas particularidades e necessidades especiais. Então porquê termos que nos conformar com uma filosofia de vida "one size fits all"?
Prometi aqui que iria partilhar a forma como comecei a estruturar o plano do que aprendi. Especialmente do que aprendi (tomando posse de uma das mais famosas expressões de Churchill) com sangue, suor e lágrimas.
Pois bem, o facto de estar a chegar a cerca de metade da minha vida e ter tanta coisa cá dentro que pede para ser verbalizada levou-me a pensar como o poderia fazer, bem como poderia MEDIR se o que estava a fazer serviria para alguma coisa.
Para isso, comecei por pensar no que é que realmente sei fazer. Tá bem que não canto mal e tenho uma paixão imensa por gerir equipas e desenvolver pessoas, mas aquilo que faço realmente bem e que é para mim um dado adquirido, natural, é escrever e falar em público. O que pode ser uma conclusão óbvia para quem me conhece mas para mim teve que ser resultado de um processo de auto-conhecimento, não tanto pela identificação do que ficaria no âmbito mas do que teria que ser descartado.
Então ok, escrever e falar em público. Já escrevi um livro de poemas, tenho planos para em breve escrever um livro sobre mulheres. Falo em público mais ou menos frequentemente, seja como moderadora ou enttrevistadora, seja como oradora em temas tão diversos como gestão, igualdade de género, Deus, DevOps... Qual deverá ser então o meu públcio-alvo? E com que conteúdo?
Confesso que este foi o maior desafio na construção do plano: a quem é que eu quero chegar? Até que percebi: deverei chegar a inconformistas como eu, pessoas determinadas a mudar o seu mundo. Não têm que ser muitas pessoas, têm que ser pessoas que pensam e sentem necessidade de mudança. Que eu possa ser mais um motor de inspiração para cada um ir lá para fora transformar vidas.
E que canais deverei utilizar e com que frequência? Aqui cruza-se tudo o que hoje está à nossa disposição, com a disponibilidade e com a necessidade de manter um certo nível de qualidade do conteúdo. Portanto, a minha primeira decisão foi reativar este blog, com pelo menos um artigo semanal, sobre temas de ordem geral: princípios, valores, questões de vida, etc. Comecei também a escrever artigos mais técnicos, em inglês, no Linkedin. Dois artigos aqui e aqui. E pelo menos uma talk trimestral.
E por fim, as métricas. Visitas, subscritores, favoritos, page views, likes, e acima de tudo os comentários - o que me dizem? E, claro, o número de presenças nas talks.
Agora que cheguei até aqui, há que imaginar o futuro. Como quero que tudo isto seja daqui a um ano, três, dez? E o que preciso de fazer para lá chegar?
Porque uma coisa é certa: se eu não o fizer, mesmo que necessariamente retirando este tempo do meu tempo de lazer, ninguém o fará por mim. E os resultados não se alcançam sozinhos...
Esta madrugada mudámos para o horário de verão. Já sei que posso contar com uma semana de jet lag à conta disso, mas sabe bem ver anoitecer mais tarde. E ver toda a natureza a anunciar a primavera. Há uma semana que dei pela chegada dela. Distraída como sou admito que todos os sinais já cá estivessem antes mas esta semana para mim foi especial, desde a saudação de um melro num destes dias logo de manhã ao sair de casa, ou uns amenos raios de sol no meio de todos estes dias de chuva.
Sabe bem. Especialmente em tempos de muito trabalho, muita preocupação. Como se a natureza dissesse: “sei que não está a ser fácil, mas relaxa, aqui estão umas surpresas para desfrutares”. E dia 20 chegou então oficialmente a estação em que tudo parece se renovar. E logo de seguida o aniversário do benjamim da família, 6 anos de animação e pilhas Duracell.
Se o primogénito me ensinou a ser algo que eu não sabia ser, nem alguma vez achei que a maternidade fosse para mim, este menino cheio de mimo mostrou-me que o amor não se divide quando nasce mais um filho, simplesmente cresce até já não caber no coração e fá-lo crescer também. E de que maneira!!
Portanto, aqui estamos nós no limiar de uma mudança de idade: o “pequenino” a ir para a primária, o “grande” a chegar à adolescência plena. Os pais deles a babarem-se sempre que veem um bebé. Longe vão os tempos das fraldas e das papas e no entanto nunca nos sentimos tão cansados como agora. Nunca tão assoberbados com preocupações. Nunca tão requisitados a fazer um esforço extra que por vezes acaba depois no lixo sem sequer ter visto a luz do dia.
Também aqui está na altura de mudar. Fazer o esforço onde seja eficaz, onde haja realmente diferença. Não se trata de reconhecimento (pronto, vá, um bocadinho também) mas essencialmente de não haver esforço inglório. É que passar meses no sobre-esforço faz-nos cansar de tudo rapidamente. Se somos requisitados para dar o nosso melhor a cada momento, sem folgas e sem descanso, que seja para inspirar, crescer. Para fazer o mundo avançar. Até para isso acontecer, é preciso mudar.
Todos sentimos vontade de desistir, por maior que seja o sentido de missão que nos move.
Aliás, quanto maior o sentido de missão e maior a visibilidade do que fazemos, maior a frustração associada ao que não corre bem, aos erros que se cometem – e sim, somos humanos, logo cometemos erros. Todos os dias. Maior a quantidade de críticas e até de ameaças.
Nessa altura pomo-nos a pensar que não vale a pena tanto sacrifício se há sempre algo que fica por fazer, que corre mal e que parece ser infinitamente pior do que tudo de bom que acabámos de alcançar. Se há sempre alguém que fica ferido no caminho, por mais que nos esforcemos, porquê perder tempo e esforço? Especialmente quando é o nosso tempo, o nosso esforço que estão em causa. Especialmente quando se trata de trabalho voluntário e poderíamos estar a fazer outras coisas, porventura tão recompensadoras e menos arriscadas.
E é aqui que se instalam o cansaço, a tristeza, a vontade de desistir. Até o medo, por vezes. Sim, medo. De falhar, de não ser aceite, de não ser amado, medo do próprio medo. E desânimo. E é aqui que me lembro do profeta Elias. Quantas vezes não terá ele experimentado medo mesmo à séria? Quantas vezes não terá ele ficado desalentado e com vontade de desistir de tudo?
E porque é que eu me lembro de Elias e não de Steve Jobs, por exemplo? Porque este último pode ter feito aparecer uma experiência de utilização da tecnologia totalmente nova, mas Elias fez algo que ainda hoje é muito difícil ou até impossível de copiar: disse que não ia chover durante três anos e não choveu, depois disse que ia chover e choveu. E o melhor de tudo: fez cair fogo do céu! Elias era claramente um grande profeta e o que fazia as coisas com mais espetacularidade. Ele conhecia bem Deus e nem isso o impediu de sentir medo à séria, e desânimo.
Aliás o desânimo era tanto que ele chegou a pedir a morte (1 Reis 19:4). Como é que é possível, num minuto está a perseguir os falsos profetas e no outro está a fugir e a pedir que Deus o mate? Na verdade o que ele queria mesmo era que tudo terminasse, para não sofrer mais nem fazer os outros sofrer. É familiar? Mas também podemos aprender com o resto da história: Deus não lhe responde nem entra em argumentos com ele. Deixa-o dormir, alimenta-o, fortalece-o e manda-o de volta mas sem antes lhe mostrar algo: o seu verdadeiro lugar. Para isso apenas repete a pergunta: “Elias, o que estás aqui a fazer?”
A verdade é que todos pertencemos a algum lugar, todos temos um papel a desempenhar. Muitas vezes queremos apenas fugir, mandar os problemas para trás das costas, e para isso fugimos do lugar onde estamos apenas para um lugar onde ouvimos a nossa vozinha interior nos perguntar: “o que estás aqui a fazer?”
Mesmo quando sabemos qual o nosso papel e o nosso lugar na sociedade, ainda assim não estamos livres de nos sentirmos com medo, desanimados, injustiçados e com vontade de desistir. O que há a fazer nesses momentos não é fugir, não é atribuir culpas a outros, é descansar. Fortalecermo-nos, relembrarmo-nos do que sabemos ser o nosso destino, o nosso objetivo. Recorrermos a quem nos ama para nos ajudar – ouvir-nos sem argumentar, fazer as perguntas certas para nos ajudar a pensar. Até que estejamos em condições de fazer o caminho de volta para o nosso verdadeiro lugar, aquele lugar onde podemos continuar a fazer a diferença com maior espetacularidade ou em pleno anonimato.
Permite-me que te pergunte hoje “O que estás aqui a fazer?”
Cada vez penso mais neste tema.