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Um certo brilho no olhar

por doinconformismo, em 28.02.14

Há dias estava a "ouvir" um amigo acerca da mudança que o passar do tempo operou nele, e isso chamou a minha atenção. Acima de tudo, o facto de num balanço naquele momento da vida, se ter apercebido de que já não tinha aquele brilho nos olhos que outrora o caracterizava.

Fiquei a pensar, quantos de nós já passámos por situações assim, e quantos hoje se encontram numa situação de desânimo, de desalento. Não é difícil entender que nos tempos em que vivemos hoje, por variadíssimas razões, qualquer um se pode encontrar nesta situação. 

 

Os primeiros sinais poderão passar por uma falta de energia aparentemente momentânea, uma letargia difícil de explicar, rapidamente dando lugar a falta de interesse ou até a uma rejeição clara, até uma decisão consciente de não-investimento do tempo em atividades, relações, ou outra coisa que outrora nos interessava bastante. E antes que nos apercebamos estamos com os olhos baços, os ombros caídos e uma tolerância zero a certas situações.

 

Como saímos daqui? Se houvesse uma única resposta científica, quem tivesse tropeçado nela estava hoje mais rico que o Bill Gates. Mas tenho para mim que um dos primeiros passos é identificarmos a situação e lidarmos com ela. Se continuarmos em negação não temos como resolver o caso, da mesma forma que alguém que esteja constipado mas convencido de que está bem não irá tratar de desentupir as vias respiratórias. E de seguida, temos que fazer isso mesmo: desentupir. Será que temos algum entulho acumulado e que esteja a retirar energia ou brilho à nossa existência? Há que limpar, varrer, retirar o que for preciso.

 

E a seguir há algum passo definido? E quando não há forças nem para limpar a casa? Temos que fazer alguma coisa e se for preciso procurar ajuda. O pior que nos pode acontecer é manter os braços em baixo e a cabeça desocupada. Temos que insistir, temos que ir à luta com toda a nossa força, por pequena que seja. Insistir especialmente naquilo que sabemos que nos faz bem, mesmo quando nos apetece fazer exatamente o oposto. Quando o coração não colabora, temos que o contrariar e usar a cabeça. E quando a cabeça está baralhada, temos ir encontrar clarividência noutro lado e continuar a tentar.

 

E como dizia, esse meu amigo, o importante é continuar a tentar, continuar a lutar, nunca desistir mesmo quando apetece desaparecer.

E eu acrescento: nunca deixar crescer um sentimento de auto-comiseração mas combatê-lo ao mínimo sinal. 

E quem sabe um dia, no meio da luta e da determinação, esse brilho não vem morar no nosso olhar outra vez...

Se deixarmos de ver desaparece?

por doinconformismo, em 25.02.14

Se não olharmos para o homem que todos os dias está no semáforo a tentar vender revistas CAIS, se fizermos de conta que não está lá, será que desaparece?

Se não olharmos para a quantidade de animais abandonados nas ruas, que parece crescer todos os dias, se fecharmos os olhos, será que eles desaparecem?

Se não olharmos para o desânimo estampado na cara de tanta gente, se fizermos de conta que nada se passa, será que desaparece?

 

E aquilo que não vemos mas ouvimos, velhinhos que não conseguem fazer as parcas reformas chegar para os medicamentos, cada vez mais caros, e a alimentação, quanto mais ajudar os filhos desempregados ou os netos mal nutridos?

E quando ouvimos de tanta gente de idade avançada que ficou sem emprego e ainda assim não tem idade suficiente para a reforma?

Ou quando ouvimos de tantos jovens que têm que deixar os estudos pois não têm meios para tal? E de um serviço de saúde a apodrecer?

 

Se taparmos os olhos, se deixarmos de ver, desaparece? 

Se taparmos os ouvidos, o ruído surdo deixa de lá estar?

Ou será preciso também desligar o cérebro? Até onde levamos o nosso bem-estar, aliado a uma indiferença doentia pelo que se passa à volta? Será que não entendemos que o se passa hoje com eles hoje se poderá passar connosco amanhã?

 

Olhamos mas não vemos, ouvimos mas não escutamos, vamos também deixar de pensar e de sentir? E onde é que isto vai parar? Vamos renunciar aos nossos princípios, vamos negar as nossas crenças, em nome do status quo, para que esteja tudo bem?

 

Não chega já? Não é já tempo de fazer alguma coisa em vez de apenas deixar andar? Nunca vi que deixar andar fosse boa filosofia, e continuo a não acreditar nisso..

 

As coisas que se pensam num quarto de hotel

por doinconformismo, em 15.02.14

Estou em trabalho no Rio. Durante a semana não dá para ir à praia nem para ir passear nem sequer para ir às compras porque trabalho é isso mesmo: trabalho. 

Saímos logo de manhãzinha, estamos às 9h no escritório, saímos depois das 20h ou 21h e ainda tentamos falar com a família e ver-lhes a cara, e então, finalmente, vamos comer qualquer coisa. Chegamos ao quarto mais mortos que vivos, perto da meia noite e no dia seguinte tudo se repete. Hoje nem tivemos tempo para almoçar, e uma alma caridosa trouxe-nos 2 pacotes de bolachas, que a dividir por 8 ou 9 foi... pouco.

 

O meu quarto é pequeno. Limpo, simpático, mas pequeno. Claro que para o tempo que eu passo lá é suficiente. E sendo pequeno há pouco para contemplar quando me deito. Além de que os pensamentos vêm em catadupas começando, é claro, pela família. Como será que eles estão? como têm sido estes dias além daquilo que se vê? Mas rapidamente chego a outros pontos, outros lugares: Como será a vida daqueles que passam semanas a sair ao domingo à noite e a regressar à 6ª ou sábado? Como será que se gere uma família a sair aos 3 meses de cada vez? Será que um dia, o lugar para onde vão, aquele quarto de hotel que pode bem ser o mesmo, repetidamente, não acaba por parecer a sua casa? Será que ao fim de tanto tempo não saberão melhor onde estão as manchas e desenhos das paredes do quarto do que os nomes dos amigos dos filhos?

 

Infelizmente esta é a realidade de tanta gente hoje. O que será que cada um guarda no seu coração? Claro que todos somos animais de hábitos, e todos fazemos o que acreditamos que temos que fazer para sobreviver ou para viver melhor. Mas a certa altura as saudades acumuladas decerto dão lugar a outro tipo de sentimentos, quais serão eles? A ilusão de que está tudo bem? A certeza de que não tem outro jeito? A desesperança por dias melhores? 

 

Hoje é dia dos namorados em Portugal, um dia a que não dou uma importância especial. Mas já falhei dias de aniversário por estar fora em trabalho. Foi um dia, e comemorámos depois. Mas quem passa a vida fora, como faz? E quem vai para um local diferente a cada semana? Como é que isto se gere e qual é o limite? A minha realidade é tranquila, muito tranquila, em comparação com o que aqui descrevo. Mas quem não consegue estar em casa mais do que um punhado de dias em cada mês, se tanto, como é que faz? Onde é que isto pára, qual é o limite?

 

Hoje é dia dos namorados em todo o lado menos no Brasil, e eu aqui no meu quarto de hotel a pensar nestas coisas...

 


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